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Cruel cidade

Manhã da segunda feira, outubro despontando nas ruas claras do Recife. Hoje é o Dia do Idoso, 15 anos do Estatuto e eu penso nos velhos e velhas dessa cidade.

Eles olham as ruas da cidade e, decerto, relembram esse mesmo pedaço em outra época, onde a memória pode alcançar.

Quando diziam que era a quarta cidade do Brasil, a Veneza brasileira, orgulho de todo pernambucano. Bela, a cidade tinha caráter, perfume, cor, cultura, dignidade e tradição. Tudo passou.

A cidade está no mundo do mesmo modo que peixes invisíveis habitam o rio. Incógnita, frágil, submersa pela onda do momento. Onda da polarização, ad exclusão, do elogio da riqueza e do consumo. Que gera lixo. Feiúra. Sujeira. Pobreza cultural. Uma selva cidade no lugar da cidade poesia.

Recife não é cidade para os mais vulneráveis. Especialmente para idosos. Aqui os velhos não têm vez. Não podem se mover em paz nessa cidade do caos.

São como seres invisíveis. Esbarram e passam à sua frente na porta do banco, da loja, na fila, em todo lugar. A cidade não tem compaixão dos seus idosos. Agride velhos e velhas com modos de sádico. Os ônibus são altos demais para pernas cansadas. Os mais jovens são deseducados para ceder um assento, ajudar na subida. As calçadas são quebradas. As motocicletas são armas perigosas. As bicicletas trafegam na contramão.

E a solidão? Olhe em volta e perceba. Talvez você não se deu conta dos velhos nos bancos das praças, portas de lojas, esquinas, cantos, cafés. Onde houve um lugar pra sentar ou encostar ali estará um idoso solitário. Para o velho ou velha, tudo fica mais difíci

l a cada dia. Nem os populistas se ocupam com projetos mentirosos para os idosos. Ninguém fala em centros de convivência, um hospital dos idosos.

O poeta disse que o Recife é uma “cruel cidade, águia sangrenta, leão” , para os nativos, Mas parece que vaticiou sobre os idosos e idosas desse século infeliz.

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