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Último desejo

Brisa na praia, pintura de Nicola Simbari

DIÁRIO DA QUARENTENA

A semana chega no seu ponto final. Foram cinco dias que valeram por quase dez. A cada manhã, mais notícias de mortes. Algumas, de gente conhecida. Mas, chega. Basta de notícia ruim – por hoje.

A quarentena é boa para a gente sonhar. Imaginar o que vamos fazer depois. Ou não faremos. Não importa. O que interessa, agora, é o sonho. O gosto bom de se imaginar fazendo aquilo que sempre se teve vontade de fazer.

Experimente, vale apena.

Eu, por exemplo, tenho a mania de planejar coisas que, tenho certeza, jamais se realizarão.

Uma viagem à Itália, com uma moça chamada Vanda. Beberemos vinho, visitaremos museus, passearemos de mãos dadas pela vie centrali di Roma, e, com sorte, vamos assistir algum filme de Federico Fellini num cinema de rua. E passearemos numa gôndola em Veneza. E tomaremos banho de mar em Capri. Encontraremos por lá a Catherine Deneuve.

Quero também morar uns tempos numa casa, de muro baixo, à beira mar de um lugar ainda seguro e de boa vizinhança, numa daquelas cidades antigas da Grécia. Eu estarei falando e lendo jornais em grego, coma maior naturalidade.

Fazer, um dia, uma feijoada completa que ficará muito gostosa e dará para alimentar todos os vizinhos e amigos e amigas e pessoas de quem eu gosto. Eles virão para o meu almoço trazendo vinhos e cachaças e licores e sorvetes para nossa sobremesa. Um regional de chorinho tocará, durante nosso almoço, pérolas de Pixinguinha e de Jacob do Bandolim.

Acertar sozinho os quinze números da lotofácil.

Adquirir um computador mais rápido do que esse onde escrevo.

Dormir, de hoje para amanhã, ao menos sete horas seguidas.

Acordar amanhã sem dores nas costas.

Por fim, sei que é pedir muito, mas, eu gostaria, meu bom Deus, que esse nosso Brasil um dia desse jeito.

E que meus netos e eventuais bisnetos, pudessem viver num país justo e feliz. Aquele, que a nossa geração tentou, mas não conseguiu legar aos nossos filhos.

Para conseguir esse último desejo, eu abriria mão de todos os outros. Ele sozinho seria bastante.

Beijos e abraços. E bom final de semana.

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