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Inúteis mensagens

Fui instado (até que enfim usei esta palavra) a escrever sobre os danos da quarentena.

No começo desse ciclo, e lá se vão 170 dias, ensaiei um diário da quarentena. Não foi uma ideia original, pois na mesma época surgiram outras 3 milhões de publicações com o mesmo nome. Só na minha cidade. Mas, a minha ficou até bonitinha.


Fiz uma diagramação de boletim, salvei como PDF e mandei pelo WhatsApp para pessoas escolhidas pela faixa etária. Velhos e velhas, para ser mais claro. Em seguida, publiquei aqui.

Foi bom, enquanto durou. Embora não tenha havido o chamado feedback, a resposta do leitor que todo jornalista ou cronista espera. De preferência com elogios, é claro, que jornalista também tem ego. E como tem.

Pois bem, esse foi o meu primeiro dano: trabalhar em vão. A sensação de que estava enxugando gelo e que ninguém absolutamente estava se importando com o meu esforço para ajudá-los a preencher o dia, se entreter naqueles 5 ou 10 minutos de leitura boba.

Logo percebi que o bobo era eu. Ninguém, absolutamente ninguém, estava preocupado com o que eu escrevia. Nem poderia. O momento era (e ainda é) para tentar sobreviver. Escapar do vírus maldito. Sobre isso, obviamente, eu não poderia colaborar com nada.

O meu pobre diário, portanto, era de uma inutilidade que dava pena. E onde quero chegar com esse lenga lenga?

No óbvio: aos olhos de uma maioria, o meu, como os demais 3 milhões de diários da quarentena não serviram para nada. Inclusive aqueles escritos por jornalistas brilhantes, e não por este simples batedor de teclas. Fizemos,

apenas, inúteis mensagens. Os isolados olharam de soslaio e deram de ombros. Leram para passar o tempo. Mas com a cabeça em outro lugar.

Tem sido este um dos males que eu aponto na pandemia: a desvalorização do texto, da crônica e da literatura. A imagem, o vídeo e a nota curta nas redes sociais deram de lavada nos que insistem em bater nesta tecla, como eu.

É o que observo, sem lamúrias, mas com certa tristeza, no isolamento desse apartamento de segundo andar, de onde peço licença para ir ali, ver um filme no (ou na) Netflix.


Imagem de Libel SanRo do Pixabay

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