Pombos
Lá de cima dos apartamentos vizinhos, percebo que alguém me vigia enquanto digito. Torço, por um segundo, para que uma fêmea me espione e sorria pela janela entreaberta. Inútil sonhar.
No cocoruto do segundo bloco, bem na ponta do parapeito, é uma pomba quem a tudo e todos observa, poderosa, dona do pedaço. Quase imóvel, ela abdicou durante um tempão da tremedeira tão típica de sua espécie. Aquele tremelique de pescoço que se espalha por todo o corpo. A pomba que me olha permaneceu imóvel sob o sol quente das 10 e meia, olhando diretamente para minha janela.
O que terá chamado sua atenção? A minha camisa amarela? A luz que reflete do monitor ou, o que é mais provável, a banana pacovan que trouxe para o lanche? Fiz o teste. Descasquei a banana, pus num pratinho descartável e deixei sob o telhado do alpendre um poubo abaixo da janela.
Voltei à labuta e, daí a pouco, escutei o arrulhar. Levantei na ponta dos pés e flagrei, entre a persiana da janela, a pomba bicando a pacovan, enquanto um pombo gordo e treloso dava pequenas cabeçadas no seu pescoço, se tremelicando todo, a cada golpe. Estavam ambos famintos.
Comments